Segundo o IBGE, os evangélicos
passaram de 15% para 22% da população brasileira em dez anos. Um crescimento de 64% no valor absoluto. Foram milhões que
encheram as fileiras das igrejas. Dezesseis milhões, especificamente. De acordo com estes dados, as igrejas pentecostais continuam em expansão
plena, já dentre as igrejas tradicionais, os batistas seguiram esse
mesmo ritmo exponencial. Aumentou ainda o número de evangélicos independentes. Em
alguns municípios, o número de evangélicos já ultrapassa o de católicos, como é
o caso da região metropolitana do Rio. Na minha própria cidade, cerca de 4 em
cada 10 habitantes é evangélico, fenômeno observado em muitos municípios
fluminenses. É um grupo que se expande com um poder político assustador! Uma gama tão grande e difusa de pensamentos, que fica impossível fugir da pergunta:
o que define o termo evangélico?
Bom, o movimento evangélico tem
suas origens nos Estados Unidos, e pode ser considerado o braço mais forte do
protestantismo. Não é uma denominação, nem uma igreja, é antes, uma corrente de
pensamento, que enfatiza:
1 – A experiência pessoal
2 – Adoção da Bíblia como única
base de fé e prática
Foi a partir desses conceitos que
o metodismo britânico e o pietismo(luteranismo) germânico expandiram sua
influência sobre outras denominações, formando a base do evangelicalismo que se
consolida a partir do século XVIII, espalhando-se da Nova Inglaterra (EUA) e da
própria Inglaterra, para o mundo. Hoje, os países mais evangélicos são
os EUA, o Brasil, o Reino Unido, a Nigéria e a Coréia do Sul. Pode-se ainda citar a Alemanha e toda a Escandinávia, de maioria luterana.
É interessante fazer essa busca
histórico-geográfica, mas quando penso na definição e na carreira histórica, fico na dúvida se o termo evangélico usado hoje, pelo menos no Brasil, ou
mudou sua definição, ou está fora de moda. Porque as diferenças são palpáveis:
(John Wesley, fundador do metodismo, e Martin Luthe King, pastor batista, o primeiro dedicado intensamente a obras de caridade, o segundo, ativista social pelos direitos dos negros americanos)
Evangélicos inicialmente eram um
grupo que valorizava a democracia e o sacerdócio universal dos crentes. Hoje,
muitas vezes parece que em algumas igrejas(que infelizmente estão em alta na
mídia), ser evangélico significa ser massa de manobra do líder. Um investimento
de alguém muito esperto, que vê em cada fiel uma renda fixa mensal.
Evangélicos inicialmente lutavam
pelos direitos humanos. As igrejas eram centro de discussão política pelos
direitos dos negros, por exemplo. Poucos sabem disso na América Latina católica, mas foi nas igrejas evangélicas americanas que o movimento abolicionista ganhou um dos
seus maiores aliados. Todavia, os evangélicos de hoje discriminam o diferente, o
que não concorda com sua visão de mundo, seja judeu, mulçumano, ateu,
homossexual, espírita, católico, feminista, umbandista e a lista segue extensa.
Os evangélicos inicialmente,
segundo o próprio Weber, quando discursando sobre a ascesse intra-mundana, eram
extremamente contidos quanto ao consumo. Trabalhavam arduamente, e ao invés de
comprarem os bens de consumo de última geração e colocarem bem grande em suas posses dizeres de “foi Deus quem me deu”, investiam no cuidado dos pobres, como
um John Wesley numa Inglaterra sofrida do século XVIII, que junto com os
metodistas, seus seguidores, doutrinou que a igreja deve preocupar-se com o ser humano de forma integral; não só com o bem-estar espiritual, mas também com o bem-estar físico, emocional, material, dando especial atenção aos necessitados e marginalizados sociais. Contudo, os evangélicos do mundo moderno, hipnotizados pela teologia da
prosperidade, trocaram a esperança de uma vida eterna vindoura pela
volatilidade de uma vida próspera temporal. Esqueceram-se que o ensinamento verdadeiro de Cristo é refletido quando se abre mão do carro do ano para investir no cuidado
dos que sofrem. (Lógico que, porém, cada caso é um caso)
(Edir Macedo e Valdomiro Santiago: arrecadadores de milhões "vendendo" para pessoas emocionalmente afligidas "milagres" e "libertação")
Dizem que só os recursos dos
evangélicos do Brasil seriam suficientes para acabar com toda fome do mundo. Não sei
se isso é verdade, mas se for, é porque alguma coisa está muito errada. E é por tal tipo de erro que muitas vezes me dá nojo de ter que carregar esse rótulo
ridicularizado, “evangélico”. Sou cristão, sou protestante, sou batista, com
muito orgulho da minha igreja, que ainda com todos os problemas que tenha,
procura manter os valores democráticos congregacionais da decisão tomada pelo
voto majoritário dos fieis. Mas não peça pra me definir como evangélico, não
como o evangélico dos tempos modernos, egoísta, orgulhoso, controlado, apático,
conformado com ordens absurdas, temporal, levado pra lá e pra cá por quem possa
oferecer a oração mais forte, o “milagre” mais rápido. Estes são aqueles que
ainda precisam entender as palavras de Cristo: “conhecereis a verdade, e a
verdade vos libertará”, de toda ignorância... Quem
sabe quando isso acontecer, eu não tenha mais vergonha do estigma...
evangélico. Até lá, prefiro me considerar um simples observador externo a este grupo. E quando ouço críticas numa roda de pessoas sensatas, continuarei a definir "eles", e não "nós". Pelo menos por enquanto.
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